quinta-feira, dezembro 30, 2010

----------- ::::::::: CORAGEM! :::::::: ----------


Preparava-me eu para acabar o ano a escrever mais um texto para aqui, com o nome “CORAGEM” quando caiu um comentário de Isabel Sousa à última publicação sobre os relacionamentos "Cais das Colunas e Osho".

Eu contava voltar mais tarde ao tema com um texto que responderia a alguns dos comentários, mas este último, porque acaba por representar todos os outros, deu-me uma oportunidade de avançar já com o meu ponto de vista e o título, CORAGEM, curiosamente, pode-se manter.

Parece-me que há uma tendência por abordar o expresso pelo OSHO pelo lado negativo e eu questiono-me se tal se deve a uma recusa inconsciente de aceitar qualquer ideia negativa sobre uma área tão bela e importante da nossa vida.

Assim, respondendo à Isabel Sousa, queria apresentar um ponto de vista melhor, que, me parece ser também o do OSHO, que ela cita aqui:

"É o que acontece em todas as relações. Ao invés de o satisfazer, dá-lhe uma enorme insatisfação. Cada relação falha neste mundo - e é bom que falhe; teria sido uma maldição se não fosse assim. É uma bênção esse falhar. Porque cada relacionamento falha, é por isso que você começar a procurar o relacionamento supremo com deus, com a existência, com o cosmos."

E pergunta a Isabel:

“Acreditas mesmo nisto? não achas que todas as formas de relacionamento podem ser compatíveis? Não achas estranho este Deus que nega o amor do próximo? Acho este teu Deus muito selectivo! O meu Deus é muito mais condescendente... "Ama o próximo como a ti mesmo"”

Eu respondo-lhe: Bom, o meu deus está dentro de mim, tal como o teu, por vezes, consigo afastar o suficiente as camadas com que a mente e o meu ego o envolvem e contactando-o directamente, ele dá-me CORAGEM para enfrentar a vida sem medo.


Esse deus quer que vivamos a vida tão plena e maravilhosamente quanto pudermos, em todos os aspectos, que amemos o próximo como nós mesmos e que, claro, que nos apaixonemos.

E que cuidemos da nossa paixão como de um jardim precioso, e que o mantenhamos lindo e florido por todo o sempre. Este é o meu desígnio, do meu deus, do teu e, creio, do Osho também.

No entanto, a vida conduz à morte e ainda bem que assim é, a vida sem morte, seria um cristal amorfo, não faria sentido.
Quer isso dizer que não devemos cuidar da nossa saúde a tentar prolongar a nossa vida e a do nosso semelhante o mais possível?

No tocante aos relacionamentos, ninguém defende que se deve acabar com eles, apenas se constata é que todos acabam.



E que o fim duma paixão, podendo ser terrível, podendo matar ou enlouquecer, pode também ser uma sublime oportunidade para nos elevarmos espiritualmente, desenvolvendo uma capacidade de amar a um nível superior, não só todo o Universo, mas também o nosso semelhante e qualquer relação que venhamos a ter posteriormente. Não é maravilhoso?

Compatibilidade? Claro que quanto mais elevado espiritualmente um casal for, mais probabilidades há de que o seu relacionamento seja muito duradouro.

Mas ainda assim, nunca será eterno. Não é verdade que na cerimónia do casamento católico o padre termina dizendo “ATÉ QUE A MORTE OS SEPARE”?

Cuidemos então da nossa paixão, se a temos, e tenhamos a coragem de amar a vida independentemente da face que ela nos apresenta!

sábado, outubro 30, 2010

Cais das Colunas e OSHO - Versão Abreviada da Tradução Anterior

Tenho que pedir desculpa aos meus leitores! De facto, um texto de mais de 4 páginas é demasiada pedra para partir...!
Mas como eu acho que o texto do OSHO que traduzi e apresentei a semana passada é muito interessante e pode originar uma boa polémica, resolvi insistir, agora numa versão abreviada com mais ou menos 3 páginas, e com umas imagens intermédias, de minha autoria, para descansarem entre parágrafos. Será desta que vão ler tudo e fazer comentários como deve ser?
Aqui vai:

O QUE É ESTE ANSEIO EM MIM QUE NENHUM RELACIONAMENTO PODE SATISFAZER, QUE NÃO HÁ LÁGRIMAS QUE ALIVIEM, QUE NÃO É ALTERADO POR MUITOS E BELOS SONHOS E AVENTURAS?



Prem Kavita, é assim, não só consigo, mas com qualquer pessoa que tenha um pouco de inteligência. Isso não é sentido por gente estúpida, mas a pessoa inteligente está, mais tarde ou mais cedo, condenada a tropeçar com o facto  e quanto mais inteligente for, tanto mais cedo vai acontecer – de que nenhum relacionamento a pode satisfazer.

Porquê? — porque cada relacionamento é apenas uma seta de indicação para a relação final; é um marco, não é uma meta. Cada caso de amor é apenas um sinal indicativo para um caso de amor maior lá mais para a frente – é apenas um gostinho, mas esse gostinho não vai saciar sua sede ou satisfazer sua fome. Pelo contrário, esse gostinho fará com que você fique ainda mais sedento, vai fazê-lo mais faminto.

É o que acontece em todas as relações. Ao invés de o satisfazer, dá-lhe uma enorme insatisfação. Cada relação falha neste mundo - e é bom que falhe; teria sido uma maldição se não fosse assim. É uma bênção esse falhar. Porque cada relacionamento falha, é por isso que você começar a procurar o relacionamento supremo com deus, com a existência, com o cosmos.

Você vê a futilidade uma e outra e outra vez, que não se vai ser satisfeito por nenhum homem, por nenhuma mulher; que cada experiência acaba numa enorme frustração, começa com uma grande esperança e deixa-lo no grande desespero. É sempre assim, chega num grande romance e termina num gosto amargo. Quando isso acontece uma e outra vez, tem que se aprender algo - que cada relacionamento é apenas uma experiência para o preparar para a relação final, para o supremo caso de amor.

(…)

É disso que trata a religião. Você diz: "o que é este anseio dentro de mim que nenhuma relação consegue satisfazer"? É o anseio por deus. Pode ter consciência disso, pode não ter. Poderá ainda nem ser capaz de expressar, exacta-mente o que é, porque no início é muito vago, nublado, cercado por grande névoa. Mas é o anseio por deus, é o desejo de fundir-se com o todo, para que acabe a separação.

Você não se pode unir com um homem ou uma mulher para sempre, a separação terá que acontecer. Essa fusão só pode ser momentânea e depois que esse momento desaparece você vai ficar numa profunda escuridão. Depois que o flash, que o relâmpago, se foi, a escuridão vai ser ainda maior do que dantes. É por isso que milhões de pessoas decidem não entrar em qualquer relacionamento amoroso - porque pelo menos uma pessoa fica habituada à escuridão e, se não conheceu outra coisa, tem uma certa satisfação: sabe que a vida é isso, que há não nada há mais do que isso, portanto não há nenhuma insatisfação.

Uma vez que você tenha provado o amor, uma vez que você tenha vivido esses momentos de alegria, dessa tremenda pulsação quando duas pessoas já não são dois.... Mas você cai uma vez e outra dessas alturas; e de cada vez que cai, a escuridão é muito mais escura do que dantes, porque agora você sabe o que é luz.

Agora você sabe que existem esses picos elevados, agora você sabe que a vida tem muito mais para lhe oferecer, que esta existência mundana de ir ao escri-tório todos os dias e voltar para casa e comer e dormir - que essa existência mundana não é tudo, que esta existência mundana é apenas a entrada do palácio.

Se você nunca foi convidado a entrar e tem vivido sempre no lado de fora da porta, então, você acha que isso é o que a vida é, vive no alpendre. Uma vez que uma janela é aberta e você pode ver o interior do palácio   a sua beleza, a sua grandiosidade, o seu esplendor — ou quando é convidado a entrar um bocadinho e logo posto para fora mais uma vez, então o alpendre já não pode satisfazê-lo. Agora este alpendre passa a ser um fardo pesado em seu coração. Agora você vai sofrer, sua agonia vai ser grande.

Esta é a minha observação, que as pessoas que são muito pouco criativas andam mais satisfeitas do que as pessoas que são criativas. A pessoa criativa fica muito insatisfeita, porque sabe que muito mais é possível mas que isso não está a acontecer. Porque não acontece?

A pessoa criativa está constantemente à procura; não pode estar descansado, porque viu alguns relances. De vez em quando abriu-se uma janela e ele viu lá para dentro. Como pode ele ficar em paz? Como pode ele sentir-se confortável e aconchegado naquele estúpido alpendre? Ele sabe do palácio, viu o rei também e sabe, "aquele palácio pertence-me, tenho direito a ele desde que nasci” tudo que é preciso saber é como entrar no palácio, como se tornar um residente permanente nele. Sim, momentaneamente ele entrou, mas tem sido constantemente posto fora.

Quanto mais sensível uma pessoa é, mais descontente se vê. Quanto mais inteligente, mais descontentamento encontrará. Tem sido sempre assim.

(…)

Os ocidentais estão a tornar-se insatisfeitos porque o conforto, as comodidades, tudo o que a ciência lhes tem proporcionado, deu-lhes tanto tempo para explorar, para meditar, rezar, para tocar música, dançar, que alguns vislumbres começaram a acontecer. Eles estão a tornar-se conscientes de que há muito mais na vida do que aparece na superfície, tem que se mergulhar bem fundo.

(…)

Uma vez que um país se torna rico, torna-se sensível. Uma vez que um país se torna rico, influente, toma conhecimento das muitas, muitas dimensões da vida que sempre estiveram lá, mas não se tinha tempo para ver. O país rico começa a pensar de música, pintura, poesia e, finalmente, meditação - porque a meditação é o último luxo. Não há nenhum luxo maior do que a meditação. Meditação é o último luxo, porque é o último caso de amor.

É bom, Kavita, que os seus relacionamentos não o satisfaçam. Os indianos estão muito satisfeitos, porque na verdade, eles não têm nenhuma relaciona-mento de todo. Casamento, não tem nada a ver com um relacionamento. Os pais decidiram e os astrólogos e quiromantes. Não tem nada a ver com as pes-soas que se vão casar; eles não são sequer ouvidas, simplesmente são coloca-das numa determinada situação em que começam a viver juntos. Isso não é um relacionamento.

Eles poderão produzir as crianças, mas isso não é amor: não há nada de romance. Mas uma coisa isso tem de bom: é muito estável. Quando não há nenhum relacionamento não há nenhuma possibilidade de divórcio. O divórcio é possível somente se houver amor. Tente compreender-me: o amor significa grandes esperanças, o amor significa "eu cheguei". O amor significa "eu encontrei a mulher ou o homem". O amor significa a sensação de que "nós somos feitos para um o outro". Amor significa que já não há nenhuma necessidade de procurar mais.

Se você partir dessas grandes esperanças, quando a lua de mel acaba, a relação acabará. Aquelas grandes esperanças não podem ser cumpridas por seres humanos. Você espera que a mulher seja uma deusa: não é. Ela espera que o homem seja um deus; ele não é. Então, quanto tempo podem se ir iludindo uns aos outros? Mais cedo ou mais tarde eles vão começar a ver a realidade. Eles vão ver a realidade e a ficção começará a evaporar-se.

Nenhuma relação pode satisfazê-lo, porque cada relacionamento começa com uma enorme expectativa, e isso é impossível de preencher. Sim, essa esperança, pode ser preenchida mas somente quando se estiver apaixonado pelo todo. Nada que seja apenas parcial pode fazê-lo. Quando se estiver apaixonado pelo total, quando acontece a fusão com a total, só então haverá satisfação. Vai haver ninguém para estar satisfeito, haverá simplesmente satisfação. E, então, ela não terá fim.

Eu sou todo pelo amor, porque o amor falha. Você fica surpreso – mas eu tenho minha lógica. Eu sou todo pelo amor, porque o amor falha. Eu não sou pelo casamento, porque casamento é bem sucedido; dá-lhe uma estabilidade permanente. E esse é o perigo: tornar-se satisfeito com um brinquedo, você tornar-se satisfeito com algo plástico, artificial, feito pelo homem.

(…)

Eu sou todo pelo amor e sou contra o casamento, particularmente o do tipo organizado, porque o casamento arranjado dá satisfação. E o amor? – o amor nunca pode satisfazê-lo. Dá-lhe mais e mais sede de um amor cada vez melhor, fá-lo ansiar cada vez mais por ele, dá-lhe uma enorme insatisfação. E esse descontentamento é o começo da procura de deus. Quando o amor falha muitas vezes, você começa à procura de um novo tipo de amante, um novo tipo de amor, uma nova qualidade de amor. Esse caso de amor é oração, meditação, os sannyas.

Kavita, é bom que o desejo de comuns casos de amor nunca chegue a ser satisfeito. Esse anseio será intensificado mais; nenhuma relação o vai satisfazer. Esses casos de amor comuns vão fazê-lo mais frustrado e nenhumas lágrimas o vão aliviar, não podem aliviar. Elas podem ajudar na altura, mas você voltará a estar cheio de dor e agonia. Nada será alterado por muitos e belos sonhos e aventuras, nada mudará. Contudo, eu digo que passe por isso. Nada será alterado, mas você será mudado ao passar por todos esses sonhos e belas aventuras. Nada será alterado no mundo.

Pense bem, Kavita, esta pergunta surgiu em si. Isso é uma mudança. Quantas pessoas há que se colocam este tipo de questão? Esta pergunta não é uma pergunta comum; não é pura curiosidade. Eu posso sentir a dor, a agonia; eu posso sentir suas lágrimas, eu posso ver suas frustrações nela, eu posso ver toda essa infelicidade e sofrimento por que deve ter passado. É quase palpável.

Nada muda no mundo. Mas, de queda em queda, algo muda em você - e isso é revolução. Até mesmo colocar uma pergunta desta natureza significa que está à beira de uma revolução. Então, é necessária uma nova aventura. As velhas aventuras falharam e é necessária uma nova - não no sentido de que você tem que procurar um outro homem ou uma outra mulher - uma nova, no sentido de que tem que procurar em uma nova dimensão.
Essa dimensão é a dimensão do divino.

Eu digo-lhe: estou preenchido e contente. Não por qualquer relacionamento no mundo, não por qualquer caso de amor no mundo, mas ter um romance com a existência inteira preenche-nos totalmente. E quando uma pessoa está preenchida, começa a transbordar. Não pode conter sua própria satisfação. Ela é abençoada, e é tão abençoada que começa a abençoar os outros. É tão abençoada que se torna uma bênção para o mundo.
Aos interessados que chegaram até aqui na leitura, pergunto, se lhes restam neurónios: Concordam? Discordam? Querem comentar?

quinta-feira, outubro 14, 2010

REFLEXÕES NO CAIS DAS COLUNAS, COM A AJUDA DO OSHO


Fim do Verão, e a minha telha levou-me a assistir ao Pôr-do-Sol no velho Cais das Colunas.

Então não é que o fotógrafo dum casamento se lembrou de levar os noivos para esse belo cenário? E os noivos lá foram fazendo as mil e uma poses do costume, ela vaporosa no seu vestido beije (?!), ele, impecável no seu fatinho cor de rato e gravata beije também. Clichés sobre clichés, quadros e quadros daqueles que, juntos com cestos de flores, recebemos às dúzias nos nossos perfis em sites sociais. Mas enfim, os noivos e fotógrafo lá prosseguiam nesse espectáculo.

Talvez por estar triste nesse dia, não pude deixar de pensar: Será que eles estão a fazer aquelas cenas de paixão (beijos à cinéfila e tudo) convictos, ou é só para a fotografia? Desejei que aquilo fosse mesmo paixão e assim sendo, até lhes perdoaria estarem ali a poluir aquele belo Pôr-do-Sol. Mas não pude deixar de pensar: Quanto tempo vai durar essa paixão? Que sofrimento futuro não se está a construir…?

Nessa noite, caiu-me do céu um texto do OSHO - poderão ler o original em inglês, aqui:
http://www.osho.com/library/online-library-relationship-satisfy-master-5d91756a-ff7.aspx
Era o que eu precisava de ler. De náusea, por um lado, mas, ao mesmo tempo, arrebatador. Era a transcrição duma conferência do OSHO, em que ele respondia às perguntas da assistência. Uma pessoa, Prem Kavinda, põe-lhe a questão:

O QUE É ESTE ANSEIO EM MIM QUE NENHUM RELACIONAMENTO PODE SATISFAZER, QUE NÃO HÁ LÁGRIMAS QUE ALIVIEM, QUE NÃO É ALTERADO POR MUITOS E BELOS SONHOS E AVENTURAS?

A resposta, com a qual me identifico (quase) totalmente, é dum realismo atroz, mas explica muita coisa e aponta uma saída sublime. De algum modo, reconfortou-me. Aqui vai a tradução:

"Prem Kavita, é assim, não só consigo, mas com qualquer pessoa que tenha um pouco de inteligência. Isso não é sentido por gente estúpida, mas a pessoa inteligente está, mais tarde ou mais cedo, condenada a tropeçar com o facto - e quanto mais inteligente for, tanto mais cedo vai acontecer – de que nenhum relacionamento a pode satisfazer.

Porquê? - porque cada relacionamento é apenas uma seta de indicação para a relação final; é um marco, não é uma meta. Cada caso de amor é apenas um sinal indicativo para um caso de amor maior lá mais para a frente – é apenas um gostinho, mas esse gostinho não vai saciar sua sede ou satisfazer sua fome. Pelo contrário, esse gostinho fará com que você fique ainda mais sedento, vai fazê-lo mais faminto.

É o que acontece em todas as relações. Ao invés de o satisfazer, dá-lhe uma enorme insatisfação. Cada relação falha neste mundo - e é bom que falhe; teria sido uma maldição se não fosse assim. É uma bênção esse falhar. Porque cada relacionamento falha, você começa a procurar o relacionamento supremo com Deus, com a existência, com o Cosmos.

Você vê a futilidade uma e outra e outra vez, que não se vai ver satisfeito por nenhum homem, por nenhuma mulher; que cada experiência acaba numa enorme frustração, começa com uma grande esperança e deixa-lo no grande desespero. É sempre assim, chega num grande romance e termina num gosto amargo. Quando isso acontece uma e outra vez, tem que se aprender algo - que cada relacionamento é apenas uma experiência para o preparar para a relação final, para o supremo caso de amor.

É disso que trata a religião. Você diz: "O que é este anseio dentro de mim que nenhuma relação consegue satisfazer"? É o anseio por Deus. Pode ter consciência disso, pode não ter. Poderá ainda nem ser capaz de expressar, exactamente o que é, porque no início é muito vago, nublado, cercado por grande névoa. Mas é o anseio por Deus, é o desejo de fundir-se com o todo, para que acabe a separação.

Você não se pode unir com um homem ou uma mulher para sempre, a separação terá que acontecer. Essa fusão só pode ser momentânea e depois que esse momento passa, você fica numa profunda escuridão. Depois que o flash, que o relâmpago, se foi, a escuridão vai ser ainda maior do que dantes. É por isso que milhões de pessoas decidem não entrar em qualquer relacionamento amoroso - porque pelo menos uma pessoa fica habituada à escuridão e, se não conheceu outra coisa, tem uma certa satisfação: Acha que a vida é assim, que não há nada mais do que isso, portanto não há nenhuma insatisfação.

Uma vez que você tenha provado o amor, uma vez que você tenha vivido esses momentos de alegria, dessa tremenda pulsação quando duas pessoas já não são dois.... Mas você cai uma vez e outra dessas alturas; e de cada vez que cai, a escuridão é muito mais escura do que dantes, porque agora você sabe o que é luz.

Agora você sabe que existem esses picos elevados, agora você sabe que a vida tem muito mais para lhe oferecer, que esta existência mundana de ir ao escritório todos os dias e voltar para casa e comer e dormir - que essa existência mundana não é tudo, que esta existência mundana é apenas a entrada do palácio.

Se você nunca foi convidado a entrar e tem vivido sempre no lado de fora da porta, então, você acha que isso é o que a vida é, vive no alpendre. Uma vez que uma janela é aberta e você pode ver o interior do palácio - a sua beleza, a sua grandiosidade, o seu esplendor — ou quando é convidado a entrar um bocadinho e logo posto para fora mais uma vez, então o alpendre já não pode satisfazê-lo. Agora este alpendre passa a ser um fardo pesado no seu coração. Agora você vai sofrer, sua agonia vai ser grande.

Esta é a minha observação, que as pessoas que são muito pouco criativas andam mais satisfeitas do que as pessoas que são criativas. A pessoa criativa fica muito insatisfeita, porque sabe que muito mais é possível mas que isso não está a acontecer. Porque não acontece?

A pessoa criativa está constantemente à procura; não pode estar descansado, porque viu alguns relances. Alguma vez se abriu uma janela e ele viu lá para dentro. Como pode ele ficar em paz? Como pode ele sentir-se confortável e aconchegado naquele estúpido alpendre? Ele sabe do palácio, viu o rei também e sabe, "aquele palácio pertence-me, tenho direito a ele desde que nasci”. Tudo que é preciso saber é como entrar no palácio, como se tornar um residente permanente nele. Sim, momentaneamente ele entrou, mas tem sido constantemente posto fora.

Quanto mais sensível uma pessoa é, mais descontente se vê. Quanto mais inteligente, mais descontentamento encontrará. Tem sido sempre assim.

Você vem dos países ocidentais para o oriente; vê o mendigo na rua, o trabalhador que transporta lama à cabeça, e sente-se um pouco surpreso: os seus rostos não mostram insatisfação. Eles não têm nada com que andar contentes, mas de alguma forma estão satisfeitos. E os indianos ditos religiosos acham que é por causa da sua religião que eles estão satisfeitos. E os chamados santos indianos gabam-se: "vejam! Os ocidentais têm tudo, a ciência e tecnologia proporcionou ao ocidente toda a comodidade possível, e contudo, ninguém está satisfeito. E no nosso país, as pessoas são tão religiosas que, não tendo nada, estão satisfeitos. Os santos deste país andam a vangloriar-se com isso, mas a sua prosápia baseia-se numa falácia. As pessoas deste país - o povo pobre, o povo ignorante, as pessoas famintas - não estão contentes por serem religiosos, estão contentes porque não têm nenhuma sensibilidade. Eles estão contentes porque não são criativos, estão contentes porque eles nunca vislumbraram nada melhor.

Os ocidentais estão a tornar-se insatisfeitos porque o conforto, as comodidades, tudo o que a ciência lhes tem proporcionado, deu-lhes tanto tempo para explorar, para meditar, rezar, para tocar música, dançar, que alguns vislumbres começaram a acontecer. Eles estão a tornar-se conscientes de que há muito mais na vida do que aparece na superfície, tem que se mergulhar bem fundo.

O oriente é simplesmente pobre - e pobreza faz as pessoas insensíveis, lembre-se. Uma pessoa pobre tem de ser insensível, caso contrário ele não será de todo capaz de sobreviver. Se for muito sensível, a pobreza será demasiado. Ele tem que fazer crescer uma couraça em torno de si mesmo como uma protecção, caso contrário como vai ele sobreviver? Ele tem de se tornar muito cego, só assim ele pode viver num país pobre.

Caso contrário o mendigo está lá, as pessoas doentes estão lá na rua, morrendo: se ele não é insensível, como ele vai conseguir funcionar? Os mendigos vão ensombrá-lo. Ele tem que fechar-se.

Você pode ver isso nas ruas indianas. O visitante ocidental pela primeira vez fica muito admirado: um homem está a morrer na rua e nenhum indiano repara nele, as pessoas continuam a andar. Isso acontece todos os dias.

Quem se começasse a preocupar com isso, não conseguiria tratar da sua vida; eles não têm tempo nenhum para tais luxos. Isso seria um luxo! Eles não podem levar a pessoa para o hospital, não têm tempo para isso. Se eles começassem a ser tão compassivos começariam a morrer eles próprios, porque quem iria ganhar para sustentar a sua família? Eles têm de tornar-se completamente cegos e surdos. Eles continuam a andar como zombies, nada vendo. O que quer que aconteça à sua volta não tem nada a ver com eles, não tem nada a ver com isso; cada um está a sofrer o seu próprio karma.

O mendigo morrendo na rua está sofrendo de seu próprio karma - talvez ele tenha sido um assassino na vida passada. Você não precisa de se preocupar com ele, na verdade, você deve estar feliz por ele estar sofrendo de seu karma; assim o seu karma chegará ao fim. No seu próximo nascimento ele nascerá com rei, ou algo assim – tudo belos raciocínios para se manter cego, insensível.

É muito difícil para o pobre ter algum sentido estético, ele não pode dar-se a esse luxo. Se ele tem sentido estético, então ele vai sentir muito a sua pobreza, que se tornará insuportável. Ele não pode ter um sentido de higiene, ele não pode ter um sentido de beleza. Ele não se pode dar ao luxo de ter essas coisas – de que serve ter essas sensibilidades? Seria uma tortura, uma tortura constante. Ele não seria capaz de dormir na sua casa degradada com todos os tipos de sujidade, com todo tipo de coisas estragadas - são as únicas coisas que tem! Ele parece estar muito satisfeito - ele tem de estar; ele não se pode dar o luxo da insatisfação.

Não tem nada a ver com religião, lembre-se. Todas as pessoas pobres estão satisfeitas, sem excepção. Você pode ir para a África e vai encontrar as pessoas pobres satisfeitas; eles são ainda mais pobres do que indianos e sua satisfação é muito mais profunda. Você pode ir a tribos indígenas indianas, que são os mais pobres do mundo, mas você vai ver em seus rostos uma particular satisfação, como se não houvesse nada de errado, como se tudo estivesse certo. Eles têm de acreditar que está tudo certo, eles têm que constantemente se auto hipnotizar para ver que está tudo bem; caso contrário como seriam eles capazes de dormir, capazes de comer?

Uma vez que um país se torna rico, torna-se sensível. Uma vez que um país se torna rico, influente, toma conhecimento das muitas, muitas dimensões da vida que sempre estiveram lá, mas não se tinha tempo para ver. O país rico começa a pensar de música, pintura, poesia e, finalmente, meditação - porque a meditação é o último luxo. Não há nenhum luxo maior do que a meditação. Meditação é o último luxo, porque é o último caso de amor.

É bom, Kavita, que os seus relacionamentos não o satisfaçam. Os indianos estão muito satisfeitos, porque na verdade, eles não têm nenhum relacionamento de todo. Casamento, não tem nada a ver com um relacionamento. Os pais decidiram com os astrólogos e quiromantes. Não tem nada a ver com as pessoas que se vão casar; elas não são sequer ouvidas, simplesmente são colocadas numa determinada situação em que começam a viver juntos. Isso não é um relacionamento.

Eles poderão produzir as crianças, mas isso não é amor: não há nada de romance. Mas uma coisa isso tem de bom: é muito estável. Quando não há nenhum relacionamento não há nenhuma possibilidade de divórcio. O divórcio é possível somente se houver amor. Tente compreender-me: o amor significa grandes esperanças, o amor significa "eu cheguei". O amor significa "eu encontrei a mulher ou o homem". O amor significa a sensação de que "nós somos feitos para um o outro". Amor significa que já não há nenhuma necessidade de procurar mais.

Se você partir dessas grandes esperanças, quando a lua de mel acaba, a relação acabará. Aquelas grandes esperanças não podem ser cumpridas por seres humanos. Você espera que a mulher seja uma deusa: não é. Ela espera que o homem seja um deus; ele não é. Então, quanto tempo podem se ir iludindo uns aos outros? Mais cedo ou mais tarde eles vão começar a ver a realidade. Eles vão ver a realidade e a ficção começará a evaporar-se. Nenhuma relação pode satisfaze-lo, porque cada relacionamento começa com uma enorme expectativa, impossível de preencher. Sim, essa esperança, pode ser preenchida mas somente quando se estiver apaixonado pelo todo. Nada que seja apenas parcial pode fazê-lo. Quando se estiver apaixonado pelo total, quando acontece a fusão com a total, só então haverá satisfação. Não vai haver ninguém para estar satisfeito, haverá simplesmente satisfação. E, então, ela não terá fim.

Eu sou todo pelo amor, porque o amor falha. Você fica surpreso – mas eu tenho minha lógica. Eu sou todo pelo amor, porque o amor falha. Eu não sou pelo casamento, porque o casamento é bem sucedido; dá-lhe uma estabilidade permanente. E esse é o perigo: tornar-se satisfeito com um brinquedo, você tornar-se satisfeito com algo plástico, artificial, feito pelo homem.

É por isso que no Oriente, em particular, na Índia… É um país muito antigo e os países antigos tornam-se sabidos, da mesma maneira que as pessoas velhas são sabidas. Espertamente, este país adoptou o casamento em crianças porque quando uma pessoa é adolescente começa a aparecer a esperança - desejo, romance, poesia; E então será complicado. A melhor maneira que a Índia arranjou foi o casamento infantil, o casamento de crianças. Elas não sabem o que é o casamento – Nem sequer têm esse desejo – O sexo ainda não amadureceu neles. Vamos casá-los!

Pensem bem – uma menina de três anos casada com um menino de cinco. Agora eles vão crescer juntos, tal como os irmãos e irmãs crescem juntos. Já alguma vez desejou divorciar-se da sua irmã? Acho que ninguém se divorcia da própria irmã. Não é preciso. Está garantida a relação. Todos acham a própria mãe boa, bonita; A própria irmã, bonita, o próprio irmão bonito. Estas coisas são dados adquiridos.

Há apenas um relacionamento que tens a liberdade de escolher : o teu cônjuge, a tua mulher, o teu homem. Na Índia até essa liberdade destruímos. Maridos e mulheres são dados, tal como os irmãos e irmãs. E quando se cresceu juntos anos e anos, desenvolve-se um certo tipo de amizade, um certo tipo de associação. Acostumam-se um ao outro.

Isto não é uma relação, isto não é amor. Mas a Índia optou pela estabilidade – e uma velha nação sabe perfeitamente que o amor nunca pode ser estável. Optar-se pelo amor é optar-se por complicações.

No Ocidente o amor tornou-se cada vez mais importante e, com isso, todo o tipo de problemas apareceu. A família está a desagregar-se, a desaparecer mesmo. As pessoas estão a mudar de marido e de mulher tantas vezes que tudo parece estar mesmo num caos.

Ouvi falar de uma actriz de Hollywood que casou pela trigésima primeira vez. Três dias depois ela apercebeu-se de que esse homem já tinha sido seu marido antes. Agora até lembrar-se de todas essas vezes… As pessoas mudam, o seu aspecto muda. Mas isso não pode acontecer na Índia. Até depois de morrer a sua esposa se lembrará de si. Nem em vidas passadas se poderá escapar, não há fuga possível.

Eu sou todo pelo amor e sou contra o casamento, particularmente o do tipo organizado, porque o casamento arranjado dá satisfação. E o amor? – o amor nunca pode satisfazê-lo. Dá-lhe mais e mais sede de um amor cada vez melhor, fá-lo ansiar cada vez mais por ele, dá-lhe uma enorme insatisfação. E esse descontentamento é o começo da procura de Deus. Quando o amor falha muitas vezes, você começa à procura de um novo tipo de amante, um novo tipo de amor, uma nova qualidade de amor. Esse caso de amor é oração, meditação, os sannyas.

Kavita, é bom que o desejo de comuns casos de amor nunca chegue a ser satisfeito. Esse anseio será intensificado mais; nenhuma relação o vai satisfazer. Esses casos de amor comuns vão torná-lo mais frustrado e nenhumas lágrimas o vão aliviar, não podem aliviar. Elas podem ajudar na altura, mas você voltará a estar cheio de dor e agonia. Nada será alterado por muitos e belos sonhos e aventuras, nada mudará. Contudo, eu digo que passe por isso. Nada será alterado, mas você será mudado ao passar por todos esses sonhos e belas aventuras. Nada será alterado no mundo.

Pense bem, Kavita, esta pergunta surgiu em si. Isso é uma mudança. Quantas pessoas há que se colocam este tipo de questão? Esta pergunta não é uma pergunta comum; não é de pura curiosidade. Eu posso sentir a sua dor, a sua agonia; eu posso sentir suas lágrimas, eu posso ver suas frustrações nela, eu posso ver toda essa infelicidade e sofrimento por que deve ter passado. É quase palpável.

Nada muda no mundo. Mas, de queda em queda, algo muda em você-- e isso é revolução. Até mesmo colocar uma pergunta desta natureza significa que está à beira de uma revolução. Então, é necessária uma nova aventura. As velhas aventuras falharam e é necessária uma nova - não no sentido de que você tem que procurar um outro homem ou uma outra mulher - uma nova, no sentido de que tem que procurar em uma nova dimensão.

Essa dimensão é a dimensão do divino.

Digo-lhe: Eu estou preenchido e contente. Não por qualquer relacionamento no mundo, não por qualquer caso de amor no mundo, mas porque ter um romance com a existência inteira preenche-nos totalmente.

E quando uma pessoa está preenchida, começa a transbordar. Não pode conter sua própria satisfação. Ela é abençoada, e é tão abençoada que começa a abençoar os outros. É tão abençoada que se torna uma bênção para o mundo."

QUEREM COMENTAR (QUANTO AO TEXTO EM SI E QUANTO À QUALIDADE DA TRADUÇÃO)?

sábado, julho 24, 2010

RETROVERSÕES!

…E agora, uma experiência de poesia: Retroversão! Gostava de saber a vossa opinião. Querem comentar?

O meu amigo João Gonçalves - procurem-no aqui:
http://www.chaosobral.org/index_pt.htm
E aqui:
http://permaculturaportugal.ning.com/profile/JoaoGoncalves
Apresenta-me uns versos dum poeta popular da sua terra – José Ramiro - e pergunta-me: “como se diz em inglês?”

DESGARRADA DE OUTROS TEMPOS

Já que és tão poeta,
Até no cantar tens proa!
Diz-me lá em cantigas
Quantas ruas tem Lisboa?!

Tem dezoito ao comprido,
Dezanove a atravessar!
E tu diz-me em cantigas,

Quantos peixes há no mar?!

Os peixes que há no mar,
Muitos vão beber ao fundo!
E tu diz-me em cantigas,
Quantos homens há no mundo!

Os homens que há no mundo,
Nem todos usam chapéu!
Diz-me lá tu em cantigas
Quantas estrelas há no céu?!


As estrelas que há no céu
Não as vou contar lá'cima!
Diz-me tu diz-me em cantigas
Quantos dentes tem a lima?!

Os dentes que tem a lima
Também os tem o limão!
Diz-me lá tu em cantigas
Se o amor me quer ou não?!

José Ramiro
http://www.chaosobral.org/hlcdomeuchao.htm

… A minha resposta :
Camarada João:
Aqui vai uma interpretação rimada, tão próxima do texto original quanto me foi possível...

A SINGUING DUEL

Since you’re a poet, come on,
Tell me, if you are aware,
By singing, In Lisbon
How many streets are there?!

Length-wise, it has eighteen
And across, nineteen streets!
And you tell me singing,
How many fish in the seas?!

The fish in the sea, swimming
Many will drink deep below!
And you tell me there, singing,
How many men in the world?!


The men in the world, living
They all one day will die!
Now tell me there singing
How many stars in the sky?!

How many stars in the sky?
You tell me by singing, fast,
Since I’m not going up that high!
How many teeth has the rasp?!

It has the same number
As a lemon, that’s my thought!
Now sing me, to this, your answer
Does my love loves me or not?!

O João parece que gostou, e volta ao ataque :
“Camarada Álvaro
Está uma rima bem jeitosa ...tenho de lhe enviar mais, não posso desperdiçar o seu talento,
agora uma bem complicada aqui:”

NUMA MATANÇA DO PORCO

Contam esta no meu Chão:
Num lugar quase vizinho,
Numa matança do porco,
Foi só homens "sem caminho"!

Nem viram fugir o porco,
Quando o iam prender!...
Mas aguardente com mel,
Souberam eles beber!...

Procuravam-no com a mão,
- No escuro do curral.
O dono cai no chão.
Um lá deu co'animal...


O da corda põe-lhe o laço,
- Mas focinho, achou pouco...
Dá o dono em gritar:
"Larguem-me, não sou o porco!!"

…E eu desenrasquei-me assim:

A HOG SLAUGHTERING PARTY

In my place they tell this story
In a village not far from me
There went unwise men only
To this local Winter party

Neither saw the hog flee
When they should tie it properly! ...
But spirits with honey,
They knew how to drink plenty! ...
Looking for it by touch, blindly

In the dark shed, with difficulty,
The owner falls on the floor, slippery.
An animal was caught finally...
The rope man ties it up, promptly

But snout, felt by touch, strangely
Seemed not as big as should be
Cries the owner franticly:
“I AM NOT THE HOG - RELEASE ME!!"

Que acham?

Álvaro

terça-feira, abril 06, 2010

…”CHORO E RANGER DE DENTES”…!

Nas minhas viagens pela NET, abordo praias maravilhosas, vou a espectáculos fantásticos, descubro ilhas e continentes. Algumas coisas vou trazendo para aqui, isto é a minha ucharia onde guardo algumas preciosidades trazidas das viagens, embora para compartilhar com os visitantes bem intencionados.
Agora, vou contar-lhes desta preciosa tertúlia em que se transformou a troca de e-mails transcontinental com o meu amigo Fábio (vejam o link aqui ao lado). Ele manda e-mails com os endereços a descoberto e o pessoal responde sobre os temas propostos, sendo a resposta depois, novamente distribuída. Isto à mistura com músicas lindas, biografias de compositores e intérpretes e outras coisas de encantar. Acho que com isto o Fábio inventou mais uma nova forma de comunicação pela net que supera youtubes, nings, orkutes, facebookes e o novel tweeter. Pelo menos em potencialidades. Vamos ver no que dá este fogo-de-artifício comunicacional…!

Eu não sou tão generoso. Mando e-mails a comunicar quando coloco aqui um novo texto, dou um cheirinho do conteúdo, mas quem quiser ler, terá que entrar aqui. E cá vou colocando uns bonequinhos apenas para orientar a leitura dos que me lêem em diagonal. A temática dos bonecos, para ter algo a ver com “Ranger dos dentes”, poderá ser um bocado feia ou agressi-va. É para dar emoção!

Pois o tema do momento, à mistura com a campanha eleitoral brasileira, é a grave crise social e económica que avassala o mundo, com reflexos particulares em Portugal e no Brasil. Parece que os correspondentes se começam a dar conta da fraude que é a democracia burguesa e da fase rapace e destruidora a que chegou o sistema capitalista. Perdidas as últimas ilusões, fica a perplexidade sobre como se caiu nesta arola e o medo de enfrentar a luta para sair dela. Transcrevo, com a devida vénia, o grito de Fábio, numa das cartas partilhadas:

“Não tenha nenhuma dúvida: os humanos vão pagar muito caro pelas acções insanas a Mãe Terra. Eu sempre tenho dito que existem duas manei-ras de evoluir na vida: (1) através da sabedoria, (2) através de choro e ranger de dentes. Mas tudo leva a crer que a humanidade optou pela (2) segunda.
Entretanto, após a dizimação em massa da espécie humana, sobrarão uns poucos que poderão reconstruir uma nova civilização mais justa, mais humana e com mais respeito para com a nossa Mãe Terra. A MUDANÇA QUE ALMEJAMOS VIRÁ, MAS SERÁ COM CHORO E RANGER DE DENTES, NÃO TENHA DÚVIDA!”


Bom, que esta ameaça existe, não há dúvida. Mas há que encontrar uma solução. Claro que a saída disto será difícil e envolverá grandes sacrifícios. Resta passarmos por isto com uma mente esclarecida para que a classe dominante não possa aplicar pela terceira vez a sua receita para ultrapassar a crise do sistema, fazendo uma III guerra mundial, ainda que agora duma forma surda e subtil, mas com efeitos ainda mais desvastadores.

A saída com choro e ranger de dentes não é uma saída. Com choro e ranger de dentes fizeram-se revoluções no passado, mas, depois de grandes vitórias alcançadas pelos povos, foi possível o retrocesso, como se viu. Porque imperou o medo e não o amor. Vai ser preciso uma mudança de mentalidade. Teremos que seguir então a via do amor.
Poderá haver a violência necessária para extirpar o tumor, como fará o cirurgião. O cirurgião não odeia o tumor. Terá que estudá-lo profundamente e poderá até apreciá-lo, mas terá a cabeça fria para desempenhar bem o seu trabalho.

Assim também os povos, para seguirem a via do amor, terão que ter coragem para, atenta e calmamente ousar perceber o que se está a passar, e descobrir os instrumentos necessários para executar a operação sem retrocessos. Os políticos traidores e oportunistas em que confiaram foram necessários para espelhar as nossas convicções falsas, implantadas na nossa cabeça, Lembro que a maior parte dos governos corruptos foram eleitos por nós. Até Hitler, foi “democraticamente” eleito pelo povo do mundo ocidental mais civilizado da altura…!

Temos então que descobrir onde errámos, e pela via do amor, ter a coragem para romper com as ideias feitas que, afinal, nos conduziram a esta situação. Não esperem que os meios de comunicação social, ao serviço da classe dominante, lhes apresente uma solução. Dialoguem, debatam, investiguem! Por mim, recomendo-lhes, a leitura desse texto fundamental para a compreensão da história, da economia e da política intitulado “Materialismo Histórico, Materialismo Dialéctico”. Vejam o link para lá aqui ao lado.

Coragem então para iniciar esta primeira leitura. Coração ao alto! O seu autor: José Estaline!!

sábado, março 13, 2010

FILOSOFIA DE PÉ DESCALÇO…



Estava eu cheio de problemas por causa da minha incultura filosófica, de que me valeu a intervenção atenta do Giovanni, na minha publicação de Janeiro deste ano. Depois da minha penitência, com a tradução, para português dum texto esclarecedor de Ken Wilber, escrevo a seguir um pouco mais sobre essa problemática, e, para ajudar os leitores em diagonal, vou pontuando o que escrevi com uns bonequinhos meus…
Na verdade, sinto a necessidade de discorrer sobre matéria filosófica, mas, ao publicá-la, e até ao permitir os curiosos espreitarem para ler e dar opinião (mesmo sendo isto um diário quase íntimo), tenho obrigação de não dizer asneiras, não?

Bom, sendo áreas para as quais tenho apetência mas pouca ciência, é quase certo que vão sair asneiras. Que faço então? Fecho o bico? Deixo de colocar aqui aquilo que é apenas um pensar alto?

Na verdade, já há patranhas e charlatanice a mais na NET. Mas também a net nos permite, se formos atentos e escrupulosos, corrigir muita asneira e ir aprendendo. Afinal, o carácter social da rede permite sempre aparecer alguém que sabe mais que nós, a dar uma ajudinha.

E esta maravilha da navegação na NET, tal como a navegação marítima dos séculos das Descobertas, está rapidamente a ajudar as mentalidades a abrirem-se e a mudarem. Quanta coisa nova se aprende aqui? Quanta coisa velha, mas sempre ocultada, que agora vem ao de cima?

Vou continuar aqui, então, a colocar as minhas interrogações e as minhas respostas, alertando quem me lê que o faça com a atitude recomendada pelo nosso grande Agostinho da Silva:

“(…) nunca pense por mim, pense sempre por você; fique certo de que mais valem todos os erros se forem cometidos segundo o que pensou e decidiu do que todos os acertos, se eles forem meus, não seus. Se o criador o tivesse querido juntar a mim não teríamos tal-vez dois corpos ou duas cabeças bem distintas. Os meus conselhos devem servir para que você se lhes oponha. É possível que depois da oposição venha a pensar o mesmo que eu; mas nessa altura já o pensamento lhe pertence."

E, sobre a legitimidade da prática da filosofia de pé-descalço, como a minha, deixo também aqui uma citação do filósofo brasileiro Paulo Ghiraldelli Jr.:

"A filosofia não é propriedade da universidade: Sócrates a iniciou nas ruas, Marx a fez nos jornais, livros e assembléias operárias, Descartes a fez nas viagens como soldados, Sartre a fez nas ruas de Paris, Marcuse a utilizou nas Assembléias do movimento de jovens de 68, Dewey a exerceu na educação, da política, Rorty e Habermas a fizeram no contexto dos grandes embates pela paz. Meu Deus! Precisa mais? Todos os grandes filósofos fizeram filosofia em situações cotidianas, de grande público ou não.
A situação de sala de aula ou de universidade é o caso específico, o caso geral e comum é a filosofia na rua. Isso não quer dizer que se deve dar aval para quem não é filósofo, o filósofo depende de uma formação cultural que implica a discussão com os pares e a formação acadêmica, mas a filosofia é uma conversaçao pública.”

Conversemos então…!!!

segunda-feira, fevereiro 01, 2010

As coisas que me passam pela cabeça, quando corro..!


Hoje, corri em Monsanto. Para melhor os introduzir no ambiente, junto duas fotos que tirei lá. E também o som da minha respiração:
HHHHHHHHHHA!
HHHHHHHHHHA!
HHHHHHHHHHA!
HHHHHHHHHHA!
HHHHHHHHHHA!
Junto às instalações do “Espaço Monsanto”, acontece uma coisa muuuuuuito ecológica:
!…Txxxxxxxxxxxxxxxx…
!…Txxxxxxxxxxxxxxxx…
!…Txxxxxxxxxxxxxxxx…
!…Txxxxxxxxxxxxxxxx…

A carreira de tiro do vizinho clube de tiro aos pratos está virada para aqui, de maneira que os , são os tiros e cada Txxxxxxxxxxx é o barulho dos respectivos chumbinhos a bater na folhagem e a cair até ao chão… bucólico, né?

Se eles soubessem como aquele soa tão parecido com os tiros dos canhangulos dos “Turras”, e se sentissem o que, ainda hoje, sinto quando ouço cada , de certeza que desistiam desse desporto! (vejam um pouco, aqui):
Lembrei-me então que o nosso Manuel Alegre é fã do tiro aos pratos, li, não me lembra onde, que até vai lá ao clube fazer a sua perninha…
Agora, parece que se vai candidatar a Presidente da República, enfim, temos actualmente um boneco de pau de direita, ele vai ser o boneco de pau de esquerda… Não vai resolver nenhum dos problemas do povo português.

Não que não me mereça simpatia. Lembra-me, bem miúdo, de o ouvir na rádio, nas noites de Verão do campismo, na “Voz de Argel” e como toda a minha família se empolgava com as suas palavras arrebatadoras.
E os seus versos alentaram-me a revolta social pela adolescência e juventude fora… Fez isso e já é muito, estou-lhe grato. Mas agora, não me agrada muito vê-lo nessa figura de boneco de pau. Por isso, me ocorre fazer-lhe um pedido.

... Um pedido inócuo e inofensivo, simples, que ele será capaz de atender, dando um pouco de vida ao boneco de pau que vai ser.
Nem lhe peço que faça transferir o clube desse local, seria já tarefa demasiada para um boneco de pau idoso. Não; pedia-lhe apenas que divulgasse, junto dos fãs desse desporto, a prática do tiro com arco e flecha. Quem sabe se, lentamente, eles se silenciassem e aderissem em massa a esse desporto milenar, que alia instinto, golpe de vista e concentração, dum modo perfeitamente ecológico, calmo e, até, mais elegante…
Estou agora a lembrar-me que isso até iria ligar o Manuel Alegre ao Robin dos Bosques, associação perfeitamente justa, adequada e necessária nos tempos que correm!
Pois é, as coisas que me passam pela cabeça quando corro… Então, o Sócrates & Companhia, esses Xerifes de Notingham, iam deixar???? Ná…
Deixa lá Manuel, não ligues, fica lá no papel de boneco de pau, já não tens idade para essas atitudes e vai fazendo mais uns poemas…!

E bem podes fazer umas caminhadas por este belo parque - atenta nas fotos que tirei, neste dia...
HHHHHHHHHHA!
HHHHHHHHHHA!
HHHHHHHHHHA!
HHHHHHHHHHA!
HHHHHHHHHHA!
…As coisas que me passam pela cabeça quando corro…!

terça-feira, janeiro 19, 2010

A Vez de BelaBelle

Sobre a questão da compreensão dos poemas, claro que há muita maneira de um poeta se expressar. Até há poetas que jogam com a forma das letras e com a disposição delas na página… Enfim, o importante é que haja poesia…!

Mas agora ia centrar-me do questionamento que a Belle faz daquele poema do Piet Hein:

UM BRINDE

A alma pode ser mera ilusão
A mente, tão sem razão
Vamos então dar ouvidos
Ao que dizem os sentidos

Percebo perfeitamente que, lido hoje, por nós, que reconhecemos a espiritualidade e a tentamos desenvolver dentro de nós, este poema mostre um Piet Hein um bocado atrasado. Mais ainda, visto pela nossa poetiza brasileira - na verdade as raízes históricas do Brasil, em contacto com a cultura dos escravos africanos e dos povos autóctones, fazem os brasileiros muito mais abertos a coisas espirituais. Mas, atenção: O poema data de uns 40 ou 50 anos atrás!

Conforme refere Ken Wilber no texto “A Falácia Pré/Trans”, que coloquei na publicação anterior, desde o após-guerra que dominavam os materialismos no mundo Ocidental – aliás, o seu reinado apenas começou a ser contestado nos anos sessenta, com os Beatles a trazerem a Meditação Transcendental da Índia para a Europa.

Em oposição ao materialismo e existencialismo, só haviam as religiões bíblicas, com o seu obscurantismo e conivência com o poder, muito justamente rejeitados pela intelectualidade e pelos cientistas …

Então, o admitir que a alma “pode ser mera ilusão”, naquele tempo, só demonstra que Piet Hein ESTAVA AVANÇADO NO SEU TEMPO, pois não rejeitava liminarmente a sua existência…!

A agora, para terminar, aqui vão mais uns poemas de Piet Hein traduzidos por mim:

THE ETERNAL TWINS

Taking fun
As simply fun
and earnestness
In earnest
Shows how thoroughly
Thou none
Of the two Discernest.

OS ETERNOS PARES

Ver no rir, só a risota
e o sério, apenas gravemente
Só uma coisa denota:
Compreensão deficiente

THE ROAD TO WISDOM

The road to wisdom? -- Well, it's plain
And simple to express:
Err
And err
And err again
But less
And less
and less.

O CAMINHO PARA A SABEDORIA

O caminho para a sabedoria? – Em português
Explica-se bem nestes termos:
Erra
E erra
E erra outra vez
Mas menos
E menos
E menos...

ON PROBLEMS

Our choicest plans have fallen through,
Our airiest castles
Tumbled over,
Because of lines
We neatly drew
And later neatly
Stumbled over.

SOBRE OS PROBLEMAS

Os nossos melhores planos falhámos
Os mais belos castelos derrubados
Porque nas linhas que muito bem traçámos
Ficaram nossos pés embaraçados


Para a próxima, responderei ao nosso amigo Giovanni, esperando que continue assíduo no meu blog e vigilante…

segunda-feira, janeiro 04, 2010

Para Belle e Giovanni

É fantástico! Estava eu ocupado a escrever um texto de resposta às questões suscitadas pela poetiza Belle, no comentário ao meu texto sobre Piet Hein, quando o Giovanni me apanhou na curva, numa errada referência a Ken Wilber no meu último texto sobre sexualidades, o que me obrigou a colocar no referido texto, uma chamada de correcção e um link para um texto de Ken Wilber explicando a questão da “Falácia pré/trans”. Pretendendo rapidamente dar a mão à palmatória, quis também publicar aqui uma tradução para português desse texto.

Se eu misturasse os dois assuntos, aparecia a amiga Aldina a comentar, com a sua mente de engenheira, que os assuntos nada tinham a ver um, com o outro. Teria, portanto, de fazer duas “postagens” diferentes…
Ponho-me a traduzir e não é que muito do que eu queria responder à poetisa Belle pode inferir-se do texto de Ken Wilber?
De facto, tudo está relacionado com tudo…!


Vou colar a seguir a tradução. Mais tarde, vou intercalar no texto uns bonecos. Não têm nada a ver com o texto, são só para guiar os que me lêem em diagonal. Os que me lêem com atenção, por favor, apreciem os bonecos depois da leitura.





A Falácia Pré/Trans

Texto transcrito de SEXO, ECOLOGIA E ESPIRITUALIDADE, por Ken Wilber

© 1995, 2000 por Ken Wilber. Por acordo com Shambhala Publications, Inc., Boston, www.shambhala.com

Traduzido do inglês, por Álvaro Costa

Desde que comecei a escrever sobre as diferenças entre estados de consciência pré-racionais (ou pré-pessoais) e estados trans-racionais (ou transpessoais) – sobre o que chamei de falácia pré-trans – fui ficando cada vez mais convencido da importância crucial da sua compreensão para se apreender a natureza de estados de consciência mais elevados (ou profundos) ou verdadeiramente espirituais.

A essência da falácia pré/trans é em si própria, bastante simples: Uma vez que os dois estados, pré-racional e trans-racional são, cada um ao seu modo, não-racionais, parecem semelhantes ou, mesmo, idênticos aos olhos dos leigos. E uma vez que se confundem estes dois estados, ocorre uma das seguintes falácias:

Na primeira, todos os estados superiores e trans-racionais são reduzidos aos estados inferiores ou pré-racionais. Experiências autenticamente místicas ou contemplativas, por exemplo, são vistas como uma regressão ou recuo aos estados infantis de narcisismo, indiferenciação oceânica, indissociação e até autismo primitivo. Por exemplo, é precisamente este o caminho seguido por Freud em O Futuro de Uma Ilusão.

Nestas descrições reducionistas, a racionalidade é o grande ponto final do desenvolvimento individual e colectivo, o ponto mais alto da evolução. Não é suposto existir nenhum contexto superior, mais largo ou profundo. Portanto, a vida é para ser vivida ou racional, ou neuroticamente (o conceito freudiano de neurose é, basicamente, de tudo o que se afaste do aparecimento da percepção racional – verdade, em si, mas que não vai longe). Uma vez que não se concebe como real, ou de facto existente, nenhum contexto mais elevado, sempre que ocorre uma ocasião genuinamente trans-racional, ela é imediatamente explicada como uma regressão às estruturas pré-racionais (uma vez que não se admitem outras estruturas não-racionais, essas são as únicas que aceitam uma hipótese explanatória). O superconsciente reduz-se ao subconsciente, o transpessoal cai no pré-pessoal, a emergência do superior é reinterpretada como uma irrupção do inferior. Todos respiram de alívio quando o mundo racional não é abalado nos seus fundamentos (pela “maré negra do ocultismo” tal como Freud erradamente explicou a Jung).

Por outro lado, se se simpatiza com estados mais elevados ou místicos, mas se ainda se confundem estados pré com trans, então vai-se elevar todos os estados pré-racionais a uma espécie de glória transracional (o narcisismo primário infantil, por exemplo, é visto como um abandono inconsciente na comunhão mística). Jung e os seus seguidores, claro, seguiram por aí muitas vezes e viram como sendo estados profundamente transpessoais e espirituais meros estados indissociados e indiferenciados, sem nenhuma espécie de integração.

Na posição elevacionista, a união trans-racional e transpessoal é vista como o Ponto Magno, e uma vez que a racionalidade egóica tende de facto a negar este estado superior, então apresenta-se a racionalidade egóica como o ponto mais baixo das possibilidades humanas, como uma inferiorização, como a causa do pecado, da separação e da alienação. Quando se vê a racionalidade como o ponto mais baixo, como o grande Anticristo, então, qualquer coisa não-racional é projectada para cima e indiscriminadamente glorificada como caminho directo para o Divino, incluindo-se aí muito do que é infantil, regressivo e pré-racional: Qualquer coisa que liberta da malvada e céptica racionalidade. “acredito porque é absurdo” (Tertullian) – Este é o grito de guerra elevacionista (uma linha profundamente recorrente em todos os Romantismos).

Freud era um reducionista, Jung, um elevacionista – os dois lados da falácia pré/trans. E a questão é que ambos estão meio certos e meio errados. Grande parte das neuroses são de facto fixações/regressões a estados pré-racionais, estados que não têm nada de glorioso. Por outro lado, estados místicos existem de facto, para além (não abaixo) da racionalidade e esses estados não são para reduzir.

Durante a maior parte da era moderna recente e, de certeza, desde Freud (e Marx e Ludwig Feuerbach), a posição reducionista relativamente à espiritualidade prevaleceu – Todas as experiências espirituais, não importava quão elevadas pudessem de facto ser, eram interpretadas como simples regressões aos modos primitivos e infantis de pensamento. Contudo, como se em reacção exagerada a isso tudo, estamos agora, e temos estado desde os anos sessenta, a gerar várias formas de elevacionismo (como fez, por exemplo, mas não só, o movimento New Age). Toda a espécie de acções, seja qual for a sua origem ou autenticidade, são simplesmente elevadas ao esplendor trans-racional e espiritual, e a única qualidade necessária para esta maravilhosa promoção, é que essa acção seja não-racional. Tudo o que é racional, é errado, tudo o que é não-racional é espiritual.

O espírito é, de facto, não-racional; mas é trans, não, pré. Transcende mas inclui a Razão; não a faz regredir nem a exclui. A Razão, como qualquer estádio particular da evolução, tem as suas próprias (por vezes devastadoras) limitações repressões e distorções. Mas, como vimos, os problemas de um determinado nível, resolvem-se no nível de desenvolvimento seguinte; Não se resolvem voltando ao nível anterior, onde o problema seria simplesmente ignorado. E é assim com as maravilhas e terrores da Razão: ela traz muitas novas capacidades e soluções, introduzindo, ao mesmo tempo, os seus problemas específicos, problemas resolvidos apenas pela transcendência para níveis superiores e trans-racionais.

Muitos movimentos elevacionistas estão, infelizmente, não para além da Razão, mas abaixo dela. Acham que são, e assim se anunciam, escaladores da Montanha da Verdade; quando, parece-me a mim, apenas escorregaram, caíram e estão a deslizar rapidamente encosta abaixo e chamam à louca corrida descendente pela encosta da evolução “entrar em êxtase”. À medida que o chão se aproxima deles a uma velocidade mortal, têm a lata de apresentar esta trajectória de colisão com o chão como o novo paradigma da transformação mundial que se aproxima, e lamentam os que ficam a ver a sua queda eminente como quem vê um choque em cadeia na Auto-estrada, e abanam a cabeça tristemente, por verem que declinamos a entrada nessa sua aventura. O verdadeiro êxtase espiritual, de dimensão infinita, fica no cimo dessa colina, não lá em baixo.

[Nota: Encontra-se uma descrição mais detalhada da falácia da pré/trans no livro Eye to Eye.]