sábado, agosto 02, 2014

O Poder das Palavras

As palavras têm poder - dizem-no escritores, críticos, políticos, poetas... Isso bateu-me forte enquanto, num domingo de Inverno esperava a chegada do METRO: "10:30" assinalava o quadro luminoso de informações - 10 minutos e 30 segundos de espera, portanto.


Tempo para observar os circunstantes, os anúncios, e aproximo-me do quadro das informações do METRO montado na parede - Direitos e deveres do utente, horários... Pois, HORÁRIOS! E deparo com duas palavrinhas no meio daquilo tudo: "DIAS ÚTEIS". Sacanas, cobras venenosas, disfarçadas de mera informação, mas automaticamente ferrando o leitor dos quadros. "DIAS ÚTEIS"!
Examinando o quadro, chego à conclusão que os tempos de espera nos dias úteis são de quase metade dos tempos de espera nos outros dias que não "dias úteis", que a frequência destes, de manhã cedo, nos chamados "dias úteis" é muito maior que durante o fim da tarde e que essas frequências diminuem ainda mais aos sábados e domingos.

Ora que grande descoberta! Pois desde que existe METRO em Lisboa, desde os meus 12 anos, que eu sei, por experiência própria, que aos sábados e domingos, TODOS os transportes públicos se rarefazem. Então, onde está a novidade??
É que agora, com o desmantelamento da nossa economia, com a gestão predadora do trabalho e das nossas riquezas, com as imposições da Tróica, o desemprego, subemprego e trabalho escravo, percebe-se claramente que o tempo que temos usado nos dias e horas em que não trabalhamos é que é verdadeiramente útil para nós! Enfim, pode-se agora sentir, bem sentido, que o "ÚTIL" tinha um dono. Ou seja, que fazia sentido perguntar: ÚTEIS PARA QUEM?!  A quem servem os transportes públicos? 

Pois é, aquelas duas palavrinhas, DIAS ÚTEIS, ali estavam, poderosas, portões fechados e óbvios que se passam sem sequer se pensar no que escondem.
Pois, naquele "dia inútil de domingo", naqueles "inúteis" minutos e segundos de espera, também senti, mais forte que nunca, que o nosso precioso tempo, nesta sociedade, tem um dono, que transportes e palavras o servem e protegem, entretendo os trabalhadores em tarefas e em torno de interesses que, a maior parte das vezes, nada tem a ver com os seus...


4 comentários:

Álvaro disse...

Como deixei passar algum tempo antes de publicar isto, resolvi verificar de novo os cartazes que o METRO afixa com os horários e "direitos e deveres". Em consoância com a crescente falta de respeito do nosso governo para com os cidadão, verifico as seguintes novidades.
a) Desapareceu o quadro dos horários;
b) os textos que ficam foram agora redigidos segundo o Novo Acordo Ortográfico Fraudulento...
Enfim, hora a hora "deus" melhora... Para o lado dos gestores!

nelinha disse...

Então não é que tu tens uma cabeça pensadora, Alvarito e ainda por cima tens razão, ainda bem que existem pessoas que reparam nos pormenores, como este dos horários do metro, por ex....Os passageiros estão tão cansados que nem tem vontade nem forças para ler o quer que seja ,muito menos no metro .Se mais pessoas se dessem ao trabalho de ler o que estava escrito ...talvez reagissem como tu e o resultado até podia ser melhor relativamente aquelas duas palavrinhas (DIAS ÚTEIS)....Obrigada pela partilha...bjs Nela A.

Anónimo disse...

Devemos então...
Ouvir mais vezes o silencio .

amigalete disse...

Afinal a espera serve para olhar. É bom saber olhar. O tempo, esse, quando o temos, sem querer damos por nós a olhar os pormenores. A rapidez com que nos habituámos faz abster-nos do belo e do importante. Ouvir o silêncio, é ouvir o barulho dos sentidos.