terça-feira, abril 29, 2008

Outra história sobre Angola, 1969…


Na época das chuvas, em Zala, a Norte de Luanda, as estradas ficavam praticamente intransitáveis. O quartel onde estávamos ficava inacessível às colunas de abastecimento que, mensalmente, traziam, desde Luanda, o que fazia falta aos cerca de 400 soldados. Passávamos algumas semanas em que o abastecimento era feito por aviões, que lançavam os caixotes com comida e outros bens necessários. Por vezes, o vento estava a favor do “inimigo”, presenteando-o com a carga dos pára-quedas desviados do alvo…Passávamos então dias e dias a comer salchichas com arroz!

Lembro-me duma altura em que, para nos deslocarmos 40 kms, até ao quartel mais próximo, situado na fazenda Madureira, demorámos uma semana, encontrando algumas vezes no lugar da picada, um caudaloso rio que fazia desaparecer grandes troços do caminho, transformado num pântano...


Nesses pântanos era frequente os veículos mais pesados ficarem atascados até aos eixos, o que significava um ou dois dias de atraso, gastos a salvar o viatura do atoleiro. Apenas esses veículos milagrosos chamados “Unimog” conseguiam passar aí, recorrendo ao guincho montado na frente. O cabo era preso a uma árvore na direcção do nosso destino e o guincho arrastava esses “burros do mato” para terreno seco.
Aliás, eu inventei um sistema de reboque utilizando dois ou três unimogues com guincho e algumas roldanas, conseguindo, ao colocar os cabos a puxar de várias direcções e alturas, retirar pesados camiões desses atoleiros. Lembro-me dum camião, marca “Magirus", creio, que fora dado como perdido, depois de as tropas de Engenharia munidas de bulldozers e gruas, terem desistido de o retirar.

Recorrendo aos guinchos dos “burros do mato”, conseguiu-se endireitar o camião e, depois, arrastá-lo para terreno firme. Claro que a carga, constando de, entre outras preciosidades, muitas garrafas de whisky, desapareceu misteriosamente. Consta dos relatórios que caiu nas mãos do “inimigo”, mas cá por mim, penso que o destino da carga foi outro, pois, também misteriosamente, muitos soldados, no resto do caminho, cantavam alegremente, tais eram as bebedeiras…
Quem também ficou muito contente foi o condutor e dono do camião, só faltou beijar-me os pés, agradecido…









4 comentários:

Maria Sem Frio Nem Casa disse...

Isso parece um filme, Álvaro!

Em Janeiro desse ano, no Saldanha, no meio da capital de Portugal, nascia eu...

Ler-te assim... 39 anos depois, parece um filme, outro mundo em absoluto, e que o era, tenho a certeza.

Um beijinho
Ana

Álvaro disse...

O comentário enviado por "FURACÃO ML" foi publicado como texto autónomo.

Álvaro

joaquim adelino disse...

Olá Álvaro.
descobri o seu blog ao consultar outros blogs amigos e, para além das corridas também me envolvo em outras áreas que me fascinam, nomeadamente o nosso envolvimento na Guerra, não porque a apoie mas sim porque a vivemos.
O seu relato pela passagem em Angola, mais precisamente em Zala, veio reavivar a minha memória, é que também estive em Zala em Março de 1970 em operações de guerrilha dado tratar-se de uma zona extremamente perigosa, eu era Pára-Quedista e de volta e meia lá ia eu para o barulho. Acredito os traumas que passou depois daquilo a que eu tive oportunidade de assistir. Eu sei que os abastecimentos era um alvo apetecível para os "turras" era aí que existia o maior risco para as nossas tropas. Um dia, depois de sair de Zala a caminho de Luanda, após mais uns dias de operações, fomos encontrar nas 7 Curvas entre Beira Baixa e Balacende uma emboscada mortífera feita a militares de Nambuangongo que vinham de Luanda com abastecimentos para aquela Região, contavam já com 7 mortos e muitos feridos. A sorte dos sobreviventes foi termos chegado naquele momento. Fiquei perturbado na ocasião poisaqueles infelizes tinham chegado à 2 meses da Metrópole e tinham apenas 21 anos de idade, tal como eu.
Mas sempre lhe digo que faz bem de vez em quando falarmos sobre isto, faz parte de nós e da nossa memória e não devemos temer falar dela. A minha História de Guerra foi contada no Correio da Manhã no dia 6 de Junho de 2008 e pode consultá-la em http://susanaadelino.blogspot.com. que é o blogue da minha filha que também pratica Atletismo.
Desejo-lhe a continuação de bons treinos e boas corridas.

Caminheiro disse...


.Olá
Joaquim Adelino,, li a tua resposta ao Alvaro salvo erro meu, li que tambem passas-te por Zala. Visita o Grupo Zala no feicebook... Votos de Um feliz Natal e muitos exitos para a tua Atleta.. Abraço de Combatente joaquim manuel bart 3861